Postagens

PERSONAGENS

Imagem

A voz de meu pai

Imagem
A voz de meu pai Não me lembro da voz de meu pai. Recordo-me de suas ideias, opiniões e crenças; não de sua voz. Se falava muito ou pouco Se era categórico em suas afirmações se sua voz era macia ou grave não consigo me lembrar me lembro de sua boa-vontade, amizade e paciência com minhas manias de adolescência. De seus conselhos sobre o trato com as meninas para mim e para toda a molecada, cujos pais não tinham tempo ou coragem de tocar no assunto. Seus eternos problemas financeiros nunca impediram que eu fosse ao cinema, comprasse camisa-esporte ou sapato marron. Para eu me dar bem na vida, deveria de ser engenheiro ou militar. Tinha muitos amigos que o chamavam pelo sobrenome. Lembro-me do retrato que fez de minha mãe Perdido para sempre no sótão da casa do interior. Do seu corte de cabelo, dos seus óculos, do seu bigode, das sopas com estranhos temperos improvisadas depois do cansaço do dia. D

estupor

Imagem
estupor esse súbito não ter    esse estúpido querer      que me leva a duvidar    quando eu devia crer esse sentir-se cair          quando não existe lugar aonde se possa ir    esse pegar ou largar essa poesia vulgar           que não me deixa mentir Paulo Leminski

Richard Diebenkorn's Sketchbooks

Imagem
A Universidade de Stanford disponibilizou os sketchbooks do pintor  Richard Diebenkorn (1922/1993) em: http://museum.stanford.edu/diebenkornsketchbooks/main.html

para Alexis

Imagem
Se Se partires sem esclarecer as dúvidas, Sem aviso, nem anúncio, sem hora marcada Assim, de surpresa Ficarei aqui, sem saber o seu nome, endereço ou RG Sem saber o porquê Se neste momento, um avião passar com ruído ensurdecedor sem notar nem avaliar, a perda destes anos. E se, de repente, partires Assim, sem se despedir Antes que eu tenha acertado as contas Perderei pra sempre a única chance que tive de ouvir o teu piano de apreciar os teus quadros, teus cavalos amestrados. para Alexis Weissenberg, (pianista búlgaro morto em 2012,  que quase vi tocar  em Montpelier, em 1993.  Ele cancelou.)

madeleines

Imagem
                     Menos de um mês após o falecimento de minha mãe recebi uma mensagem, por meio de um desses milagres da tecnologia pelos quais estamos todos enfeitiçados atualmente, me convidando para participar de um encontro de amigos e conhecidos do passado.           O período em questão refere-se aos quase dez anos que vivi com minha mãe em Campos do Jordão, entre 1956 e 1967, ano em que concluí o curso ginasial e decidi morar com meu pai em São Paulo, por mais dez anos, até o falecimento dele em 1977. O contato fez emergir um turbilhão de memórias, personagens e episódios escondidos nas dobras do tempo. Fotos com imagens aparentemente esquecidas, guardadas na gaveta da memória, no armário da nostalgia, como madeleines de Proust, despertaram minha memória involuntária, evocando sentimentos ambíguos. Pequenas lembranças, afetos, emergiram com a rapidez de um flashback transformando minha cabeça numa tela de cinema cuja película, parafr

Pintura Sobrevivente

Imagem
A pintura sobrevivente É comum a relação entre pintura e história da arte, história que de alguma maneira recriou a própria ideia de Arte, dividindo suas manifestações em artistas, períodos e estilos, datas e grupos, povos e acontecimentos. Na história o tempo é totalmente abstrato, calcado na linguagem e definitivamente não experienciado por nós. Em uma olhada por sobre estas pinturas, constataremos que não podemos vê-las apenas pelo vocabulário fixo e sedentário da história. Nômades, as imagens, não só na pintura, estão totalmente imbricadas de temporalidade e são a própria existência do tempo, arrastando com elas as formas que, desde o platonismo, se pretendem fixas e eternas.  As formas são pathos e foram forjadas na antiguidade, ao contrário do que prevê a história, elas não começam nem acabam pois também se transmutam  no tempo e sobrevivem  de uma maneira pulsante e intensa  através de todas as obras do homem. Na pintura as formas são evocadas na temporalidade d